segunda-feira, março 12, 2007

Letreiratura: Fornada de 11 de Março

«Como os animais se deixam atrair pelo alimento, também os homens não seriam apanhados se não esperassem morder alguma coisa.»

PETRÓNIO, O Satiricon, Publicações Europa-América, Mem Martins, 2000, p. 158

Não há fome que não dê em fartura.
Em dia de festejos não se poderia ser tão comedido como na semana anterior, em que levei à Galeria as aulas de catequese da «Imitação de Cristo», do séc. XIV, atribuída a Tomás de Kêmpis, e que preferi manter longe desta pastelaria de modo a não a tornar demasiado decente.
Esta semana escolhi uma obra com tudo aquilo que caracteriza os Gregos na Antiguidade: ginasios, piscinas, jantares, prosa e muita taradice. Sei que estamos em época de jejum, mas a esse aspecto dediquei-me na semana passada. Não se pode exigir tanto de moçoila desta idade.
Este Domingo, recebemos nos sofás da Galeria a visita de Petrónio, senhor proibido durante largos anos nas bibliotecas mais castas. O Satiricon foi escrito no século I depois do nascimento de JC. Dos trechos que restam dele escolhemos quatro para salpicar o programa, entre os quais o seguinte:

«Ao ouvir isto, o invertido muda de cavalo, monta o meu camarada e massacra-o com golpes de nádegas e beijos. No meio de tudo isto, Giton tinha-se levantado e estoirava de riso. Quartila viu-o e perguntou, com o mais vivo interesse, a quem pertencia o rapaz. E, como eu respondesse que era o meu irmãozinho, perguntou:
- Nesse caso, porque não me beijou?
Chamou-o e abraçou-o com força. Em seguida, fez escorregar a mão por baixo da sua túnica e manipulando-lhe o instrumento ainda virgem, disse:
- Aqui está quem amanha me servirá amavelmente para me despertar o apetite; hoje, depois de ter comido uma bela enguia, não me apetece peixe miúdo.»

PETRÓNIO, O Satiricon, Publicações Europa-América, Mem Martins, 2000, p. 28

Além de descrições como a acima transcrita, o livro tem um conjunto de pérolas aversas ao decoro como, por exemplo,

«é mais vantajoso polir o membro do que o génio» (p.97),

mas também tem uma fatia que nos lembra algumas características pessoais que o Zodíaco nos imprime:

«Carneiro (...) todos os que nascem sob este signo têm muitos rebanhos, muita lã e também a cabeça dura, a testa insolente, o corno aguçado. sob este signo nasce a maioria dos intelectuais e dos argumentadores.(...) Touro (...) os recalcitrantes, os vaqueiros e os que são assaz grandes para tratarem de si próprios. Sob os Gémeos nascem os carros de dois lugares, os bois atrelados, os testículos e os que comem com duas dentaduras. (...) Câncer (...) mais de um pé para dançar e muitos bens em terra e no mar, consegue sempre tudo o que quer, seja onde for. Sob o Leão nascem os glutões e os autoritários; sob a Virgem, os efeminados, os fugitivos, os embaraçados; sob a Balança, os carniceiros, os perfumistas e todos os que vendem a peso; sob o Escorpião, os envenenadores e os assassinos; sob o Sagitário, os vesgos, que olham para os legumes e empalmam o toucinho; sob o Capricórnio os miseráveis, a quem as desgraças fazem crescer os cornos; sob o Aquário, os taberneiros e os aguadeiros; sob os Peixes, os cozinheiros e os retóricos.»

PETRÓNIO, O Satiricon, Publicações Europa-América, Mem Martins, 2000, pp. 40-41

Literatura do Séc. I. Que tal?

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